O preço médio da passagem de avião registrou em 2022 o maior valor na série histórica da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), que começou em 2011. Dos 12 meses do ano passado, oito tiveram o maior valor mensal no período analisado pelo g1.
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Segundo os dados da Anac, a tarifa média no ano passado foi de R$ 644,5. O valor é R$ 113 mais caro que o de 2021, e R$ 126 maior que o de 2019, antes da pandemia. Os preços foram corrigidos pelo IPCA atualizado até fevereiro de 2023.
Os valores mensais de 2023 seguem em patamar ainda mais alto que os do ano passado. Janeiro deste ano teve o maior valor mensal (R$ 591,66) desde 2012. A tarifa média de fevereiro (R$ 572,12), por sua vez, só perde para a de 2012 e 2014.
Outra métrica que indica o avanço no preço de viagens de avião é o valor médio por quilômetro pago pelo passageiro (índice chamado de yield médio). O valor de fevereiro deste ano, dado mais recente disponível, é o maior nos últimos oito anos. Esse índice também registrou recordes no ano passado, nos meses de abril, maio e setembro.
André Castellini, especialista no setor e sócio da Bain & Company, afirma que a pandemia provocou uma inflação de custos generalizada e que o setor aéreo também foi afetado. Ele acredita que o preço das passagens só deve cair se houver uma queda na cotação do dólar ou do combustível, dois dos principais gastos das companhias.
“O petróleo aumentou muito, o dólar aumentou muito. Os custos de uma companhia aérea são muito ligados a esses dois fatores. O custo do querosene é cotado em dólar. No fundo, esses são os fatores fundamentais”, explica.
A atual metodologia da Anac, em que são consideradas tarifas aéreas comercializadas de todas as linhas domésticas regulares de passageiros, foi adotada em junho de 2010. O primeiro ano completo com esses dados, portanto, é 2011.
Dólar e combustível pesam na passagem
Apontado por especialistas como um dos principais vilões no aumento do preço das passagens, o preço do dólar está em índices elevados, com cotação atual pouco abaixo dos US$ 5.
A Associação Brasileira das Empresas Aéreas (Abear), que reúne as principais empresas do setor, explica que o câmbio representa 60% dos custos de uma companhia aérea. “A relação de moeda mostra que o valor do dólar no início de 2014 era praticamente a metade do valor que temos hoje”, diz, em nota.
Outro fator que pesa na tarifa é o valor do querosene de avião, que atingiu recordes consecutivos nos últimos anos, segundo dados da Anac — o monitoramento vai até janeiro de 2013. O valor atual, R$ 5,27/Litro, só não é maior que os registrados em alguns períodos de 2022.
Segundo a Abear, o preço do querosene de avião, que responde a cerca de 40% dos custos, foi “agravado pela pandemia e, no último ano, pela guerra na Ucrânia, comprometendo todo o mercado internacional de óleo e gás, pressionando os custos de refino do petróleo. Apenas de 2019 para 2022 o custo do combustível subiu 121%.”
A Abear disse ainda que considera positivas as recentes medidas anunciadas para redução do preço do combustível e a desoneração de impostos sobre o setor, mas defende que é necessário revisar a forma como é cobrado o combustível usado nos aviões.
“O combustível brasileiro segue precificado como se viesse do exterior, sendo que mais de 90% desse insumo é produzido no país. O QAV disparou nos últimos três anos e isto impacta custos estruturais e preços de bilhetes”, afirma.
Total de passageiros não retomou níveis pré-pandemia
A quantidade de pessoas viajando de avião dentro do Brasil ainda está inferior ao nível pré-pandemia. Segundo a Anac, 6,5 milhões de passageiros circularam pelo país em fevereiro deste ano, 14% a menos que em fevereiro de 2020, antes da pandemia, quando 7,7 milhões de passagens foram vendidas.
Esse percentual de recuperação segue estável nos últimos meses, segundo Castellini, devido ao preço das passagens. “A retomada estagnou neste nível por causa do valor mais alto de tarifas. Ou seja, acho que não está se popularizando mais, mas dizer que está se reelitizando acho um exagero”, diz.
Castellini aponta ainda que as soluções de videoconferências, popularizadas durante a pandemia, ainda impactam o mercado. “Se viu que parte das viagens a negócios que estavam sendo feitas pré-pandemia podia ser feita via videoconferência. Isso também explica um pouco, no segmento de negócios, uma diminuição da demanda”, afirma.
“A redução de tarifa só pode ocorrer naqueles dois cenários [queda do petróleo ou do dólar]. Não tem milagre. Até um desses fatores acontecer, o número vai ficar mais ou menos estagnado. Não tem como o brasileiro médio, digamos assim, viajar mais.”
Menos passagem barata no Norte e Nordeste
Os preços das passagens não são iguais entre as regiões brasileiras. O Sudeste e o Sul, por exemplo, têm ofertas muito mais baratas que as regiões Norte e Nordeste.
Segundo a Anac, de 2022 a fevereiro de 2023, mais da metade (50,5%) das passagens comercializadas foram de até R$ 500. Já um em cada quatro bilhetes vendidos (25,8%) custou até R$ 300.
Esse percentual aumenta nas regiões Sudeste, Sul e Centro-Oeste — puxada pelo Distrito Federal —, mas cai consideravelmente no Norte e Nordeste.
A diferença entre os preços das tarifas é ainda maior quando consideramos os estados separadamente. Enquanto 61,2% das passagens saindo de Santa Catarina custaram até R$ 500 no período, somente 6,1% dos bilhetes com origem em Roraima estão nessa faixa.
Ponte aérea nas alturas
Assim como o país, o tradicional trecho entre a capital fluminense e a capital paulista vem registrando aumento no preço das passagens de avião nos últimos meses. O valor da tarifa média anual, tanto da ida quanto da volta, é o maior desde 2012.
A tarifa continua alta neste ano. O preço médio mensal de fevereiro de 2023 (R$ 446 e R$ 428), por exemplo, é o maior desde 2016. Janeiro, por sua vez, teve o maior valor mensal médio (R$ 490 e R$ 476) desde 2014.
Enquanto os aeroportos de Congonhas e Santos Dumont ainda tentam retomar a movimentação de antes da pandemia na ponte aérea, empresas que operam as viagens de ônibus interestaduais entre as duas capitais tiveram aumento de 27% no movimento.
Dois milhões de passageiros fizeram os trechos Rio-SP e SP-Rio em 2022, contra 1,6 milhão no ano de 2019. O crescimento no trajeto destoa da tendência nacional no setor rodoviário, que registrou 7% menos passageiros em 2022 (37,8 milhões) na comparação com 2019 (40,7 milhões).