Uma decisão da Justiça Federal de Tupã, de 6 de dezembro último, pode colocar fim a um drama administrativo que travou a instituição Clínica de Repouso Nosso Lar (hoje PAI - Polo de Atividades Integradas Nosso Lar).
Desde 1996 a União cobrava da instituição recolhimento de tributos patronais não recolhidos, em diversas ações em curso nas Varas Cíveis da Comarca de Adamantina, na Vara Federal de Presidente Prudente e na Vara Federal de Tupã.
Em sua argumentação para o não recolhimento, a instituição tem pautado, desde então, pela previsão legal contida na Constituição Federal, conforme Artigo 150, Inciso VI, Alínea C, e Artigo 196, §7º.
Na prática, esses dois artigos da CF, combinados com outras legislações complementares, vedam à União, Estados, Distrito Federal e aos Municípios instituir imposto sobre patrimônio, renda ou serviços a instituições dessa natureza e com finalidade filantrópica beneficente.
As medidas judiciais demandadas pela União há mais de duas décadas desencadearam grandes problemas administrativos e de ordem financeira à instituição, que ficou impedida de obter certidões de regularidade fiscal, necessárias à obtenção de subvenções públicas, o que levou até mesmo ao risco de encerramento de atividades em Adamantina, de âmbito regional, no atendimento a pacientes mentais e dependentes químicos.
Detalhes da decisão da Justiça Federal de Tupã
Essa nova decisão da Justiça Federal de Tupã é datada de 6 de dezembro último, sob a identificação de Procedimento Comum (7) Nº 5000277-77-2017.4.03.6122, assinada pelo juiz Vanderlei Pedro Costenaro, e tramita junto à 1ª Vara Federal de Tupã.
No processo, a Clínica de Repouso Nosso Lar (hoje PAI Nosso Lar) foi representada pelo advogado Henrique Fernando de Mello, de um escritório sediado em São José do Rio Preto, que já atuou em demandas semelhantes, em temas tributários de alta complexidade.
Nos autos, a Clínica se coloca como instituição de assistência social na área da saúde, sem fins lucrativos, entidade filantrópica e beneficente que atua oferecendo tratamento, inclusive com internações temporárias, a pessoas que possuam doenças psiquiátricas e relacionadas a dependências químicas. E como entidade beneficente de assistência social, com utilidade pública reconhecida nos âmbitos municipal, estadual e federal, alega fazer jus às imunidades tributárias constitucionalmente previstas no art. 150, inciso VI, alínea c e no art. 195, §7º, da Constituição Federal (CF).
No processo judicial a instituição relata que a União Federal tem atuado com execuções fiscais de tributos que “sequer poderiam ter sido constituídos, haja vista a sua condição de entidade de assistência social titular de imunidade”. Essas execuções tramitam nas Varas Cíveis da Comarca de Adamantina, na Vara Federal de Presidente Prudente e na 1º Vara Federal de Tupã.
Desta forma, alegando dificuldade de obter certidões de regularidade fiscal, que por sua vez impede acesso a subvenções públicas, com risco até mesmo de encerramento de suas atividades, a instituição se dirigiu ao Poder Judiciário a fim de demonstrar que os créditos tributários exigidos através das execuções fiscais ajuizadas pela União Federal devem ser anulados, por afronta aos artigos 150, VI, c, 195, §7º e 146, II, da CF, onde alega preencher todos os requisitos previstos no Artigo 14 do Código Tributário Nacional (CTN), lei complementar que disciplina a imunidade tributária.
A instituição pontua ainda serem nulas as várias Certidões de Dívida Ativa (CDAs) que embasam as execuções fiscais em tramites nos diversos juízos, por desrespeito ao Artigo 202 do CTN, Artigo 2º, §§ 5º e 6º da Lei 6.830/80 e Artigo 5º, LV, da Constituição Federal.
A União, por sua vez - cita a decisão judicial - alegou que a instituição não instruiu os autos com certificado do CEBAS (Certificação de Entidades Beneficentes de Assistência Social). Segundo a União, além do certificado do CEBAS, deferido pelo Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, "cumpre à entidade-autora atender às exigências constantes no art. 29 da Lei 12.101/09 para fins de reconhecimento do direito à imunidade".
Já a instituição, em réplica nos autos, sustentou que o cumprimento dos requisitos previstos no art. 14 do CTN dispensariam, conforme entendimento do STF (Supremo Tribunal Federal), a apresentação do certificado CEBAS para a configuração do direito à imunidade tributária.
Para juiz, desde 1996 a instituição atende os requisitos
Em sua manifestação nos autos, o juiz da 1º Vara Federal de Tupã, Vanderlei Pedro Costenaro, destacou o histórico da Clínica de Repouso Nosso Lar e sua atuação desde 1969, bem como descreveu que as atividades dos membros da Diretoria Executiva e do Conselho Fiscal, são exercidas gratuitamente, sendo vedada a distribuição de lucros, bonificações ou vantagens outras aos associados, sob qualquer forma ou pretexto. “Os documentos trazidos nos IDs 3246963, 3247194, 3247221, 3247244 e 3247282 demonstram que a entidade-autora nunca distribuiu lucros, mesmo porque acumula sucessivos prejuízos financeiros”, cita.
Ainda segundo o magistrado, a instituição juntou documentos alusivos a convênios firmados com o sistema público de saúde, em especial, com o Estado de São Paulo e com o Município de Adamantina, assumindo obrigação de prestar assistência médica e hospitalar psiquiátrica, universal e gratuita, visando melhorar a qualidade de vida dos usuários, proporcionando-lhes dignidade, socialização e inserção social, atendimento integralmente abrangido pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Trata-se, portanto, segundo o magistrado, de entidade privada, sem fins lucrativos, que presta serviço gratuito de saúde no âmbito do Sistema de Seguridade Social, enquadrando-se no conceito de "entidade beneficente de assistência social" para fins do Artigo 195, § 7º, da Constituição. "Em suma, pelo menos desde 1996, a entidade-autora preenche os pressupostos do art. 14 do CTN, o que lhe permite acesso às imunidades tributárias previstas nos arts. 150, VI, c, e 195, §7º, da Constituição Federal", destacou.
O juiz relatou também que, pelo menos desde 2012, a instituição possui Certificado CEBAS, conferido pelo Ministério da Saúde, por prestar serviço ao Sistema Único de Saúde, válido até 6 de dezembro de 2018, data da nova decisão judicial.
Com toda essa argumentação técnica e os subsídios legais lançados no processo pela Clínica, o juiz expediu sua decisão. "Desta feita, extingo o processo, parte sem resolução de mérito (art. 485, VI, do CPC), parte com resolução de mérito (art. 487, I, do CPC), a fim acolher o pedido para declarar que a entidade-autora, desde 1996, goza de imunidade tributária na forma dos arts. 150, VI, c, e 195, §7º, da Constituição Federal", decidiu o magistrado, nos autos.
e no art. 195, §7º, da Constituição Federal (CF).