Apesar de avanços na investigação e sanção de grandes esquemas de corrupção, a falta de reformas legais e institucionais pode explicar a sequência de resultados ruins.
O Brasil apresentou em 2018 nova queda no Índice de Percepção da Corrupção (IPC) da Transparência Internacional: o principal indicador de corrupção no setor público do mundo. A nota do país no IPC recuou dois pontos, de 37 em 2017 para 35 pontos, o que fez com que o Brasil perdesse 9 posições no ranking global. A escala se estende de zero a 100, e quanto menor o valor, maior a percepção da corrupção. A pontuação do Brasil foi a menor desde 2012 - ano em que se modificou a metodologia do indicador e passou a ser possível a análise em série histórica - e representou o 3º recuo seguido na comparação anual. Com essa nota, o país empatou com Argélia, Armênia, Costa do Marfim, Egito, El Salvador, Peru, Timor Leste e Zâmbia. A pontuação fez com que o Brasil passasse para a 105a posição dentre as 180 nações e territórios avaliados pelo IPC - a pior colocação do país dos últimos sete anos.
O IPC é a mais longeva e abrangente ferramenta de medição da corrupção no mundo. Existe desde 1995, mas seus dados passaram a ser estatisticamente comparáveis ano a ano a partir de 2012. É também a referência para o nível relativo de corrupção nacional mais uti lizada no planeta por tomadores de decisão dos setores público e privado para avaliação de riscos e planejamento de suas ações.
Análise Brasil
Na avaliação da Transparência Internacional - Brasil, o persistente mau desempenho do país no ranking não significa que tudo o que foi feito nos últimos anos para combater a corrupção não teve resultado. É inegável que grandes esquemas de ilícitos e privilégios foram revelados no período recente, principalmente pela operação Lava Jato e seus desdobramentos. O fato de haver hoje importantes figuras do mundo político e empresarial atrás das grades é uma prova disso. Há de se destacar também que esta sucessão de escândalos e ações de investigação e punição por parte das autoridades federais tende a aumentar, em um primeiro momento, a percepção de que a corrupção está piorando. A tarefa de reverter esta avaliação depende, no entendimento da organização, de uma série de reformas que demonstrem sério comprometimento do país com a eliminação das causas estruturais deste problema social.
"O fato de o Brasil prosseguir com uma performance tão ruim no IPC 2018 é revelador. A Lava Jato teve - e continua a ter - importância vital para romper com a impunidade histórica da corrupção no Brasil, principalmente de réus poderosos. Mas ela sozinha não será capaz de efetivamente reduzir os níveis de corrupção. Para isso será necessário que o Brasil olhe agora para frente na luta contra a corrupção, atacando as raízes do problema com reformas legais e institucionais", afirma Bruno Brandão, diretor executivo da Transparência Internacional - Brasil.
A experiência de 25 anos da TI em 110 países aponta que, quando o enfrentamento da corrupção avança, seus mecanismos adaptam-se para garantir sua sobrevida. "O resultado ruim deste ano foi certamente influenciado pela total inércia do governo Temer e do Congresso em fazer avançar políticas públicas e reformas anticorrupção - apesar de este ser um tema de prioridade máxima para a população brasileira. Ao contrário, o que se viu foi um presidente e diversos de seus ministros sob acusações gravíssimas de corrupção e tentativas renitentes de garantir a impunidade, como o infame indulto natalino de Temer, beneficiando descaradamente os condenados da Lava Jato. Isto certamente influenciou a percepção no Brasil e no mundo de que os esforços do país na luta contra a corrupção podem não significar ainda uma mudança de patamar e, pior, pode haver retrocessos", acrescenta Brandão.
"A boa notícia é que temos uma oportunidade única diante de nós. Em 2018, a sociedade brasileira se mobilizou - em um processo facilitado pela Transparência Internacional - Brasil e Fundação Getulio Vargas - e desenvolveu o maior pacote de reformas anticorrupção do mundo. Trata-se das Novas Medidas contra a Corrupção, um pacote de 70 propostas legislativas e regulatórias para realmente atacar as raízes do problema. A campanha "Unidos contra a Corrupção", também lançada no ano passado em apoio ao pacote, conseguiu reunir o compromisso de 54 parlamentares eleitos - e o número de deputados e senadores que nos procuram para aderir está crescendo. Nosso objetivo é que esta seja a semente de uma frente parlamentar anticorrupção, que fará avançar as reformas propostas pela sociedade", completa a coordenadora da Transparência Internacional - Brasil, Nicole Verillo.