Agentes da Polícia Federal estiveram na Câmara dos Deputados, na noite desta terça-feira (12), depois que a internet e o sistema da Casa apresentaram inconsistências. Os problemas ocorreram em meio à votação da "PEC Kamikaze", proposta do governo que concede uma série de benefícios sociais às vésperas das eleições, e somente para este ano (veja detalhes abaixo).
Após o problema técnico, o presidente da Câmara, deputado Arthur Lira (PP-AL), suspendeu a votação dos destaques da PEC, e o segundo turno, e solicitou uma investigação da PF. À TV Globo, Lira afirmou ter pedido um relatório que aponte se o problema nos servidores causado por ação interna ou externa.
As equipes da Polícia Federal chegaram ao Complexo Avançado da Câmara por volta das 22h desta terça-feira e deixaram o local pouco depois das 3h desta quarta-feira (13). Os agentes não deram informações sobre as apurações feitas nos servidores da Casa.
De acordo com Arthur Lira, se o problema tiver sido causado internamente, a Câmara buscará punir os responsáveis. O presidente da Casa reclamou ainda da frequência com que vem enfrentando falhas no sistema durante votações importantes.
'Apagão'
Logo no início da discussão da PEC, a internet e o sistema de votações remoto da Câmara começaram a apresentar inconsistências. Os deputados – obrigados a registrar presença no Plenário, mas autorizados a votar remotamente por meio de um aplicativo – não conseguiram acessar o sistema.
Lira pediu, então, que os parlamentares fossem ao plenário registrar seus votos. O presidente da Câmara chegou a dizer que as dificuldades com a rede da Casa não eram apenas técnicas, e que pediria investigação à Polícia Federal e ao Ministério de Justiça e Segurança Pública.
"Os dois links, os dois servidores de internet da Casa caíram ou foram cortados automaticamente no mesmo período, de duas empresas diferentes", afirmou. "Vou fazer uma queixa formal à Polícia Federal, ao Ministério da Justiça. Isso é interferir no trabalho livre e na autonomia do Poder Legislativo", disse Lira.
"Não é usual, não é normal, não é compreensível que dois sistemas de internet sejam desligados simultaneamente na Câmara dos Deputados. Para isso, nós vamos investigar", completou.
Suspensão da sessão
A expectativa é que a sessão seja retomada nesta quarta-feira. À reportagem, Lira afirmou que, caso ainda não seja possível usar o sistema da Casa nesta manhã, tem o apoio do sistema do Senado. Na terça, ao suspender a votação, ele citou o "fato técnico relevante".
"Ouvindo aqui os líderes que me procuraram, esta presidência decide suspender essa presente sessão com o fato técnico relevante que houve, estranho à vontade da casa, à vontade dos deputados. Mantendo o painel, para amanhã cedo a partir das 9h, com o mesmo painel", afirmou.
"Manter o painel" significa que a presença registrada pelos deputados nesta terça continuará valendo para a sessão de quarta, o que pode agilizar a retomada da votação. No entanto, parlamentares pediram que o registro de presenças seja reiniciado nesta quarta.
'PEC Kamikaze'
A PEC prevê gastos de R$ 41,2 bilhões em medidas de auxílio à população pobre e a algumas categorias profissionais e a decretação de um "estado de emergência" no país a fim de contornar a legislação, que proíbe a geração de novas despesas em ano eleitoral.
Entre outros pontos, a PEC, discutida a menos de três meses das eleições, aumenta o valor do Auxílio Brasil, amplia o Vale-Gás e cria um "voucher" para os caminhoneiros. Os benefícios acabam em dezembro deste ano.
O texto original da PEC chegou a ser apelidado de "PEC Kamikaze" pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, que o considerava "suicida" por representar risco às contas públicas. Na ocasião, o governo ainda não cogitava essa PEC como alternativa para turbinar eleitoralmente a pré-candidatura à reeleição do presidente Jair Bolsonaro.
O texto já foi aprovado no Senado no último dia 30. A oposição vê na PEC uma ação eleitoreira do governo. Ressalta que as medidas só valem até o fim do ano e, além disso, vão comprometer as contas públicas. Mesmo assim, no Senado, votou a favor do texto.
A proposta abre caminho para uma série de benefícios. Veja abaixo:
Auxílio Brasil: ampliação de R$ 400 para R$ 600 mensais e previsão e cadastro de 1,6 milhão de novas famílias no programa (custo estimado: R$ 26 bilhões);
Caminhoneiros autônomos: criação de um "voucher" de R$ 1 mil (custo estimado: R$ 5,4 bilhões);
Auxílio-Gás: ampliação de R$ 53 para o valor de um botijão a cada dois meses — o preço médio atual do botijão de 13 quilos, segundo a ANP, é de R$ 112,60 (custo estimado: R$ 1,05 bilhão);
Transporte gratuito de idosos: compensação aos estados para atender a gratuidade, já prevista em lei, do transporte público de idosos (custo estimado: R$ 2,5 bilhões);
Taxistas: benefícios para taxistas devidamente registrados até 31 de maio de 2022 (custo estimado: R$ 2 bilhões);
Alimenta Brasil: repasse de R$ 500 milhões ao programa Alimenta Brasil, que prevê a compra de alimentos produzidos por agricultores familiares e distribuição a famílias em insegurança alimentar, entre outras destinações;
Etanol: Repasse de até R$ 3,8 bilhões, por meio de créditos tributários, para a manutenção da competitividade do etanol sobre a gasolina.