O juiz da 2ª Vara Criminal da Comarca de Presidente Prudente, João Pedro Bressane de Paula Barbosa, recebeu nesta quinta-feira (17) a denúncia apresentada pelo Ministério Público Estadual (MPE) contra o médico cardiologista Augusto César Barreto Filho, de 74 anos, e determinou a prisão preventiva do acusado de abuso sexual de pacientes em seu consultório.
O MPE apresentou à Justiça na segunda-feira (14) denúncia criminal contra o cardiologista e pediu a decretação de sua prisão preventiva.
Na Delegacia de Defesa da Mulher (DDM), em Presidente Prudente, já foram registrados 33 relatos de abuso sexual de mulheres contra Barretto Filho.
Foi solicitado na noite desta quinta-feira (17), por mensagem, um posicionamento do advogado Emerson Longhi, que atua na defesa do médico Augusto César Barretto Filho, em relação à decisão da Justiça, mas até a última atualização desta reportagem não obteve resposta. O G1 também não conseguiu contato com o advogado por telefone.
Antes do recebimento da denúncia e da decretação da prisão do médico pela Justiça, Longhi afirmou ao G1 nesta quinta-feira (17) que o profissional "se desligou faz tempo" do Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo (Cremesp). Porém, não precisou a data. E confirmou que Barretto Filho "não está trabalhando mais, há vários meses".
O advogado também manteve a declaração de que não deseja se manifestar sobre o assunto "em respeito ao cliente, aos familiares do cliente, às mulheres e aos familiares destas mulheres”, e que o fará somente no processo. Ele ainda salientou que "o processo corre em segredo de Justiça".
Na denúncia, o promotor de Justiça Filipe Teixeira Antunes acusa o médico de cometer o crime de violação sexual mediante fraude, previsto no artigo 215 do Código Penal, com pena de reclusão de dois a seis anos, agravado pela conduta tipificada no artigo 61, inciso II, alínea g, que trata do abuso de poder ou violação de dever inerente a cargo, ofício, ministério ou profissão.
O caso tramita em sigilo no Fórum da Comarca de Presidente Prudente.
Antunes explicou que o pedido de prisão preventiva do médico foi feito à Justiça como forma de garantia da ordem pública, já que no entendimento do MPE existe o risco de ele voltar a praticar os delitos contra pacientes.
Segundo o promotor de Justiça, as investigações realizadas pela Delegacia de Defesa da Mulher, em Presidente Prudente, foram iniciadas em julho de 2018, a partir do relato de uma vítima.
"Ele acariciava as partes íntimas das vítimas durante o atendimento médico dentro de seu consultório para a sua satisfação sexual. Essas carícias não tinham nenhuma relação com o atendimento médico. Ele abusava da confiança das vítimas. Ele tocava as partes sexuais das vítimas e esfregava o seu pênis nas mulheres", descreveu o promotor de Justiça.
Em depoimento à Polícia Civil, segundo o MPE, o médico negou os fatos e disse que vai se manifestar em juízo.
As mulheres identificadas como vítimas tinham entre 18 e 50 anos quando foram abusadas, segundo o MPE.
Na avaliação de Antunes, como existe a possibilidade de outras mulheres terem sido vítimas do cardiologista, a orientação é para que procurem a DDM para que os casos sejam apurados.
'Estado de choque'
Ao detalhar o caso que deu origem às investigações, em julho de 2018, a Polícia Civil relatou que o médico acariciou "de forma lasciva" a perna e a virilha da paciente, assim como introduziu a mão no interior de sua calcinha, apalpando a vagina da mulher, durante o atendimento no consultório. Além disso, segundo a polícia, o cardiologista colocou a mão da vítima em seu pênis, enquanto aferia sua pressão arterial.
"Não bastasse, o médico ainda pediu para ela virar de costas para auscultar seu coração e efetuou movimentos contínuos semelhantes aos utilizados na prática de conjunção anal, encostando seu quadril na região das nádegas da vítima", salientou a polícia.
A vítima explicou que havia passado por consulta com o mesmo profissional em maio do ano passado e naquela ocasião o atendimento transcorrera dentro da normalidade. Sua pressão arterial foi aferida com a mulher sentada, assim como pela secretária, e a paciente ainda realizou um exame de eletrocardiograma.
Como lhe foram solicitados outros exames, a mulher retornou ao médico em nova consulta no dia 19 de julho de 2018, oportunidade em que o abuso sexual ocorreu.
Durante o abuso, a vítima repetiu por duas vezes, segundo a Polícia Civil, que não gostava daquele comportamento, mas o médico "fitou os olhos de maneira firme e prosseguiu".
A paciente descreveu que entrou em "estado de choque", passou a chorar, mas não conseguiu gritar por socorro. A mulher ficou sem reação, exceto a de pedir ao médico diversas vezes para parar.
Sindicância
O Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo informou que o pedido de cancelamento de registro profissional, apresentado pelo médico, foi indeferido, uma vez que ele responde a uma sindicância.
"Tal cancelamento tornaria nulas as consequentes medidas punitivas", esclareceu o conselho.
A apuração está a cargo da Câmara Técnica de Assédio Sexual, criada para investigar esses tipos de casos.
Em nota oficial, o Cremesp apontou que as novas denúncias contra o cardiologista serão juntadas à investigação em curso.
Registros
A Delegacia de Defesa da Mulher, em Presidente Prudente, já contabiliza o registro de 33 mulheres que alegam terem sido vítimas de abuso sexual cometido pelo cardiologista durante atendimento em seu consultório.
Somente nesta quinta-feira (17), sete mulheres compareceram à delegacia para registrar os seus relatos sobre os abusos.
Além disso, a Polícia Civil ainda recebeu, apenas nesta quinta-feira (17), 19 telefonemas de mulheres que buscaram orientações sobre como proceder diante do ataque sexual cometido pelo médico.
Em todos os casos registrados na Polícia Civil, os relatos apontam que as vítimas foram atacadas quando passavam por atendimento médico no consultório do cardiologista, em Presidente Prudente, ao longo dos últimos 25 anos.
'Piada'
Uma das mulheres que registraram Boletim de Ocorrência nesta quinta-feira (17) na DDM, relatando terem sido abusadas sexualmente pelo cardiologista, disse que amigos e conhecidos fizeram "piada" quando souberam do caso dela.
"A gente vê que o machismo está em todo lugar. Até em casos como este. Quando, na época, eu disse que havia sido abusada pelo médico, disseram que eu teria gostado. Quando afirmei que viria até a delegacia denunciar, hoje, falaram: 'Se ficou tanto tempo sem denunciar, é porque gostou'", afirmou Simoni Aparecida de Oliveira, de 32 anos, que mora em Tarabai.
Ela disse ter sido abusada pelo profissional no consultório médico dele em 2014.